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Imaginem a madrugada de Sergio Moro entre a noite do dia 24 e a manhã do dia 25 de julho. No dia 24, a Polícia Federal prende estelionatários (a essa altura, já temos informações suficientes para não chamá-los de "hackers") que invadiam contas de Telegram pertencentes
a autoridades - e então Sergio Moro comemora nas redes sociais, pois imaginava que constituiria uma "virada de jogo" em relação à Vaza Jato; afinal, sempre esteve acostumado a desqualificar os adversários ideológicos pelo método de imputar-lhes as pechas de "criminosos"
e "corruptos", e o circo estava armado para passar a fazer isso com Glenn Greenwald.

Ao fim do dia, Moro começa a perceber a furada sem tamanho em que se meteu. Com a apreensão dos computadores dos golpistas pela PF,
as mensagens de Telegram extraídas da conta de Deltan Dallagnol serão autenticadas e estarão integralmente disponíveis para os advogados de pessoas acusadas na Lava Jato, inclusive os da defesa de Lula,
para que sejam usadas a fim de anular os processos criminais em relação aos quais houve quebra da regra de imparcialidade do juiz.

Assim, Moro passa a perceber que: (i) depois de dois meses negando a autenticidade das mensagens,
elas serão autenticadas por órgãos oficiais; (ii) o material poderá ser usado em prol dos acusados, o que era difícil até aquele momento; (iii) provavelmente alguns processos criminais serão anulados em razão da suspeição do juiz - o que representa uma mácula indelével a qualquer
(ex-)magistrado; (iv) até o Supremo Tribunal Federal reconhecerá que era suspeito para julgar alguns casos; e (v) o ex-presidente Lula provavelmente será solto.

Essas cinco consequências gerariam a desmoralização dele, como nunca antes vista em relação a um Ministro da Justiça:
comprova-se que era um mentiroso (quando negava a veracidade das mensagens), e que nunca foi imparcial quando juiz - acarretando até a soltura do ex-presidente cuja prisão representa um troféu para o bolsonarismo.

Mas não pára aí. Em uma das mensagens vazadas,
Moro disse a Dallagnol que "duvidava da sua capacidade institucional de limpar o Congresso Nacional". Ao se lembrar disso, imagino eu que lá pela madrugada, Moro se desesperou - porque essa é a única mensagem que, caso seja verdadeira,
pode derrubá-lo do cargo e jogá-lo ao ostracismo. Ficará difícil para Bolsonaro decidir comprar uma briga com o Congresso Nacional só para manter Moro, quando pode trocá-lo por qualquer outro juiz da Lava Jato sem que haja maior prejuízo perante sua militância bolsonarista
(como, por exemplo, Marcelo Bretas - que chegaria agradando evangélicos).

A única solução que restou a Moro consistia na destruição dessas mensagens apreendidas pela PF, e passou o dia de ontem operando desesperadamente com esse propósito.
Telefonou a dezenas de autoridades para avisar-lhes que elas haviam sido hackeadas, com o objetivo de tentar obter apoio institucional para seu discurso de que "as mensagens devem ser destruídas" (repito, única providência apta a garantir que permaneça no cargo),
alegando razões que vão desde a segurança nacional até a inviolabilidade da privacidade das vítimas. Moro sabia que a destruição das mensagens depende de uma decisão judicial, mas também sabe que essa só virá na velocidade desejada (antes que os advogados obtenham cópias)
se houver amplo apoio institucional.

Não suficiente, o desespero fez com que ficasse matutando sobre meios de usar do cargo para intimidar Glenn Greenwald, o que resultou na edição de uma "coincidente" portaria dispondo sobre os casos em que estrangeiros deverão ser
deportados/repatriados do país por força de práticas criminosas. Conquanto essa portaria não deva se aplicar a Glenn - porque é residente no Brasil, casado com brasileiro e pai de brasileiros (art. 55 da Lei de Migrações) - é evidente que foi editada para constrangê-lo e
para atiçar a militância bolsonarista que opera contra ele.

A oportunidade em que publicada não deixa dúvidas quanto ao propósito intimidatório da portaria: ela consiste no único ato publicado pelo Ministro da Justiça no Diário Oficial da União de hoje (bit.ly/2YtpsV0).
Sim, isso mesmo: não há mais nenhum documento que tenha sido assinado ontem pelo Ministro da Justiça e publicado hoje no Diário Oficial. Imaginem ele, em meio a tamanha crise, tendo tempo para revisar e assinar somente essa portaria - é porque ela é também fruto da crise.
Sergio Moro, ontem, teve seu dia de político delinquente comum: passou o dia em seu gabinete concebendo estratégias para apagar os rastros de seus atos ilícitos e abusando do cargo para se proteger e constranger adversários. Atuou como típico tiranete mafioso de terceiro-mundo.
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