Voltando da reunião peguei um taxista que dirigia meio nervoso, o telefone dele tocava sem parar e era a Joyce, ele não atendia e ficava mais puto, Quase bateu o carro na marginal. Pedi pra ir mais devagar, fiquei até com medo de falar pq tava longe pra cacete, no Campo Limpo.
Pra minha surpresa, ele pediu desculpa, começou a dirigir com mais calma e explicou: a Joyce é a ex mulher dele, estão separados há alguns meses e têm 4 filhos. A Joyce liga todo dia pra ele, várias vezes por dia. Pede muitas coisas, não quer fazer acordo com juiz por escrito.
A Joyce não foi na audiência de conciliação do divórcio, não quer assinar os papéis, ele não quer entrar no litigioso porque não tem dinheiro nem emocional pra isso. Ele já tava quase chorando quando chegamos no Itaim.
Ele está trabalhando há 2 meses sem parar pra conseguir pagar as contas. Voltou a morar com a mãe. Jurou que paga pensão direitinho, justamente por isso tá muito sem dinheiro. Tá pensando em vender o táxi e fazer outra coisa pra ter o salário certo.
Me deu uma dorzinha no coração. Fui conversando com ele, aconselhei ele a tentar tirar pelo menos um domingo de folga, pegar os filhos, passear um pouco ou mesmo ficar em casa brincando. Falei que a Joyce deve estar muito magoada, e que gente magoada muitas vezes fala sem pensar.
Que mesmo que ele não tenha feito nada (ele falou que a separação foi conversada e decidida) ela pode ter ficado magoada. Pra ele ter paciência e tentar conversar com ela, ouvir o que ela tá falando nas entrelinhas. Ele disse que vai tentar "pelo bem dos filhos".
O taxista era um homem de uns 40 anos, negro, alto. A cara triste e cansada. Pois o bicho começou a chorar de verdade qdo chegamos na Sumaré, pedi pra ele encostar o carro na frente do mercado. Perguntei se ele queria água, não quis. Dei tapinha no ombro, falei que ia melhorar.
Ele chorou uns 5 minutos, me pediu desculpas, eu disse que tudo bem, que as vezes é bom dar uma chorada pra colocar pra fora. Ele falou que não conversa essas coisas com ninguém, não tem coragem, que nem sabia porque tava me falando aquilo.
Se recompôs, voltamos ao caminho. Ele me deixou aqui em casa agradecendo muito, dizendo que Deus ia me abençoar, eu disse que ia abençoar ele também. Recomendei que ele tentasse falar como tava se sentindo pra Joyce, ouvir o que ela sente também.
Entrei aqui no prédio e chorei no elevador e chegando em casa. Sorte que hj a Cida tá aqui, perguntou o que houve, contei, ela fez um cafezinho pra gente. Acalmei. Mas que coisa dolorida isso.
Eu nem fiz nada, eu só ouvi, fiz o mínimo mesmo. Espero de coração que ele consiga resolver as coisas, e falar mais sobre isso com outras pessoas, e que seja acolhido por elas. Que dificil é ser criado pra não ter sentimento, pra ter vergonha de falar que está triste ou com medo.
Que ele e Joyce se acertem, que ele consiga trabalhar e ganhar seu dinheiro, que as crianças cresçam com uma boa mãe e um bom pai. A vida pesa muito, e sozinho pesa mais ainda. A gente tem que aprender a falar o que sente e a ouvir os outros também.
Eu quis contar isso não pra dizer que eu sou demais, porque eu realmente não fiz nada, só deixei o cara falar. Contei porque fiquei muito comovida com a situação dele, e quis dividir o peso também. Achei que seria bom contar, colocar pra fora.
