Thread by @lucasmafaldo

Os panelaços de ontem foram um evento político importante. É um sinal forte do cerco que está se fechando ao redor de Bolsonaro.

Mas isso está muito longe de significar o fim do governo. O caminho até um impeachment é longo e ele pode reverter isso com relativa facilidade.

O evento foi importante pelo seguinte motivo: até agora, a oposição de Bolsonaro vinha principalmente de uma bolha que acompanha política de perto, da imprensa e de articuladores políticos (o tal "establishment"), mas com pouquíssima penetração popular, além da base da esquerda.

Fora da bolha dos "politizados", a verdade é que a grande maioria da população não liga muito pra política. Eles podem até se definir como sendo de esquerda, direita, liberal, etc., mas na prática, eles só votam porque são obrigados.

Eles podem reclamar do governo, mas...

... é mais pelo gosto de falar mal do que realmente se importar. Se o voto fosse voluntário, muitos ficariam em casa.

A grande vantagem política de Bolsonaro até o momento é que ele conseguiu fazer muita gente de fora da bolha se importar -- e muito. Ele tem gente pronta para...

... defendê-lo na rua. Enquanto isso, a oposição não tinha números significativos nem para organizar um protesto contrário -- e, muito menos, para se unir em torno de uma alternativa.

Esse jogo de forças mudou, mas pouco. A "tropa" de Bolsonaro (a militância efetiva) é ainda...

... muito maior do que a tropa de qualquer líder alternativo.

Dito isso, o panelaço mostra que o jogo está virando. A oposição agora tem ao menos alguma base popular.

Isso é um sinal importante que o governo precisa ouvir, se quiser sobreviver.

Mas a solução (ainda) é fácil...

... porque a maioria dos novos anti-bolsonaristas continuam sem ligar muito para política. Eles estão preocupados em sobreviver à epidemia.

Se Bolsonaro encarar o coronavírus com seriedade a partir de agora, esses novos anti-bolsonaristas vão parar de priorizar a política.

Veja que não estou dizendo que eles vão passar a GOSTAR de Bolsonaro. Mas há uma diferença enorme entre desgostar e querer derrubar o governo. Esse novo grupo irá esperar 2022 para substituí-lo.

Além disso, os anti-bolsonaristas ferrenhos, que quiserem avançar um impeachment...

... DURANTE uma epidemia, serão desmoralizados diante de boa parte da população. O povo lembra como foi traumático retirar Dilma. Ninguém quer passar por aquilo de novo se não for absolutamente necessário.

Além disso (e isso talvez seja o principal), remover o líder...

... em uma crise econômica envia um sinal que muda as expectativas do mercado. Mas a epidemia não liga para expectativas. Ninguém sensato vai querer arriscar nem um mês de paralisia do governo federal diante de uma epidemia feroz.

Por isso, embora o panelaço seja...

... importante, ele é um sinal para o governo redobrar os esforços contra o coronavírus. Não é sinal de derrubada do governo.

Boa parte da população logo perceberá que não há meios legais de remover Bolsonaro nos próximos meses -- que são o que importa para a epidemia.

Claro que, se a coisa começar a piorar muito, uma situação de anomia pode surgir. Mas aí não será o momento de impeachment, mas de golpe mesmo. Será uma guerra direta pelo poder difícil de prever, pois não conhecemos as alianças reais nos bastidores.

Aí a epidemia vira fichinha.